domingo, 23 de dezembro de 2007

Capítulo 37 - A História Obscura

- Bom, tudo começou cerca de um mês atrás - disse Adam, dando início à narrativa. - Eu estava na cama, quase dormindo, em um prédio na cidade de Scacci. Foi quando vi um clarão, uma luz intensa, e apareci nessa cidade de repente. Pelo que a gente constatou todos vieram mais ou menos do mesmo jeito.

Davis, Samantha, Jacques e Gary deram um sorriso. Acontecera o mesmo com eles.

“O incrível é que a gente chegou mais ou menos junto com umas trinta pessoas! Todas confusas e sem saber onde estávamos. Nós chegamos perto da praça, pelo menos a maioria, e então, como vocês, nós admiramos a estátua e ficamos nos perguntando o que será que tudo aquilo significava.”

- Como sabem que nós vislumbramos a estátua assim que chegamos? - interrompeu Davis. - Estiveram nos espionando?

- Nã... - começou Adam, mas Nicole o impediu de continuar.

- Sim - confessou ela. - Na verdade, sim. Ficamos assustados em saber que mais gente tinha chegado e, por isso, alguns foram espiar vocês...

- Ah! - exclamou Jacques. - Foi então que um do grupo de vocês, o Willard, morreu, não é mesmo?

Adam e Nicole pareceram se assombrar com a questão. A moça se pôs a coçar a nuca, desconfortavelmente, e o rapaz olhou para baixo. Sem responder a indagação, Adam deu de ombros e seguiu contando:

- Bem, como eu ia dizendo, a gente ficou meio perdido, mas no primeiro dia tudo correu normalmente. Até que, naquela noite, três dos nossos morreram. Como vocês bem sabem, pois vivenciaram a mesma situação, ficamos pasmos em saber que havia um assassino na cidade, mas não tomamos nenhuma atitude.

- As peças de xadrez se mexeram? - perguntou o francês.

- Não, Jacques. Nenhuma delas. - E antes que o outro pudesse indagar por quê, Adam fez um gesto para que ele nada dissesse e acrescentou: - Eu vou chegar lá. Enfim, conforme as noites iam passando, mais de nós iam sendo brutalmente mortos. Parecia-nos que havia somente duas pessoas provocando os homicídios.

A informação chocou um pouco alguns que não sabiam haver mais de um assassino na cidade. Mesmo assim, ninguém o interrompeu de novo.

“Infelizmente, nunca vimos o rosto de nenhum deles, somente de relance. Uma semana depois de chegarmos aqui, só restavam vinte e dois de nós. Mesmo assim nenhuma peça do tabuleiro havia se movido um centímetro ainda. Não entendíamos o motivo da chacina, resolvemos, então, nos esconder. Encontramos uma casa que, por pura sorte, tinha duas geladeiras com um pouco de comida dentro. Quanto à água, usávamos a da praça, como vocês.”

“Mais uma semana se passou. Graças a Deus, a estratégia de nos abrigarmos deu certo: naquela segunda semana, somente duas pessoas morreram. Logo que eles nos achavam, mudávamos de casa e, assim, demoravam nos achar novamente.”

- E a comida? Onde arranjavam comida quando saíram do primeiro abrigo? - perguntou Samantha, evidentemente curiosa.

- Voltávamos a cada três dias na casa com as geladeiras para comermos - respondeu Nicole.

- Ficavam durante três dias sem comer?!

Os dois assentiram e Adam voltou a contar sua história:

- Duas semanas depois de nossa chegada, foi a vez de vocês. Assim que ouvimos barulhos fora do comum, fomos averiguar cautelosamente o que era. Foi quando Lin resolveu se infiltrar no grupo de vocês, alegando que ficaria mais protegida do que conosco.

Dessa vez, os quatro não conseguiram se conter: Samantha soltou um gritinho, Davis e Gary arregalaram os olhos e Jacques pôs a mão na boca. Eles até teorizaram a possibilidade da chinesa pertencer ao outro grupo, mas escutar a confirmação da hipótese saindo da boca de Adam era novamente surpreendente. O rapaz prosseguiu:

“Bem, enquanto observávamos vocês três”, disse, apontando para Davis, Samantha e Jacques, “encontrando-se com o resto do grupo, vimos uma discussão acontecer. Não pudemos distinguir por quê, mas eu, que estava entre os que vigiavam vocês, notei o seguinte: primeiro, ouvi vozes ao longe; depois, elas foram se aproximando e vi duas pessoas. Uma delas estava encapuzada e a outra... bem, a outra era Willard.”

Silêncio. Todos pareciam prender a respiração.

“Não sabemos se quem se escondia sob o capuz era homem ou mulher, porém costuma atender pela alcunha de ‘Wert’. Wert, então, perseguiu Willard e, quando pôde, deu vários tiros nas costas do infeliz.”

- Por quê?

- Não sei. Ninguém sabe - Adam olhou para Nicole, e ela confirmou a resposta. - Só sabemos que foi isso que aconteceu.

- Tudo bem, continue - apressou Jacques, ansioso.

- Bom, daí vocês chegaram e tudo mudou. Como Willard tinha morrido, Wert teria que nos assassinar sem ajuda alguma, então...

- Como assim?! - questionaram Samantha, Davis e Jacques em coro.

- Como assim o quê?

- Quer dizer... Willard era o homem que matava vocês? - perguntou Davis.

- Desculpem se esqueci de dizer. É, Willard Tye é quem nos assassinava junto com Wert.

- A propósito - acrescentou Nicole. - Willard era irmão de Wert.

A confeitaria mergulhou em um incômodo silêncio por alguns segundos. As peças do quebra-cabeça pareciam estar todas na mesa e, agora, Adam e Nicole estavam ajudando-os a montá-lo.

- Poxa... bem, vá em frente - sugeriu Jacques.

- O.k. Como eu ia dizendo, Wert agora não tinha mais seu irmão e, sem dúvida, não daria conta de matar os dois grupo sem auxílio. Somando os dois, davam umas trinta e poucas pessoas. Foi aí que Kaninchen apareceu.

Era meio-dia, contudo ninguém prestava atenção no relógio. Será que descobririam algo sobre Kaninchen nos próximos minutos?, pensavam as pessoas que escutavam atentamente a história de Adam.

“Também não sabemos se Kaninchen é homem ou mulher,” ao falar isso, Adam evitou olhar para a direção de Samantha, “mas o fato é que, aparentemente Kan chegou com vocês. Desconhecemos como ou por quê, mas é fato que a partir do dia em que chegaram, alguém começou a matar os membros do nosso grupo e dos seus. Foi quando as peças do xadrez começaram a se mover.”

“Hanz, um alemão que estava em nosso grupo, nos disse que esse codinome significava ‘coelho’ na língua dele.”

Uma ponta de remorso por Edwin transpassou a mente de alguns.

“E... vocês já sabem. Kaninchen começou a matar a gente e, ás vezes três por noite, era eliminado de nosso grupo. E ninguém escapou: morreram o Arthur, o Hanz, o Charles, a Anne, todos! Só restamos nós.”

Dessa vez, Nicole impôs sua voz zombeteira:

- O curioso é que a pessoa que matou quase todos do nosso grupo, está bem na minha frente. Ah, Kaninchen, seu cafajeste... - disse, correndo os olhos por cada um na confeitaria.

Novamente, não houve manifestações.

- Foi isso que vieram nos contar? - questionou Davis.

- Na verdade, não - respondeu Adam. - Isso foi só para vocês entenderem a história. O que viemos contar a vocês é sobre o diário.

- Que diário?

Nicole parecia bastante exausta quando disse:

- Willard, antes de morrer, mantinha um diário. Nele ele escrevia tudo o que se passava durante os dias em que nos perseguia e alguns dias antes também, quando as duas únicas pessoas na cidade eram ele e Wert.

- E vocês leram esse diário - indagou Samantha.

- Lemos - respondeu Nicole com um sorriso. - Estava em latim, mas conhecíamos alguém que sabia traduzir e ele traduziu tudo, tudo, tudo. Desde a primeira letra, até o último ponto.

Kaninchen engoliu em seco, porém ninguém notou.

“Viemos aqui, então, lhes contar o que ele dizia.”

- O que estão esperando então? Comecem logo! - exclamou alguém.

- Agora não - falou Adam, depois de bocejar. - Estamos extremamente cansados, não dormimos há dias e há muito a ser dito a respeito do diário! Deixe-nos descansar um pouco e daqui algumas horas lhes contaremos tudo o que resta.

Todos assentiram. Cinco minutos após, os dois estavam acomodados em um canto da confeitaria.

* * *

- Não, não pode ser o Jacques - cochichou Adam. - Conheço ele há anos, nunca faria uma coisa dessas! Assassinar dezenas de pessoas inocentes a sangue frio? Não, não é o estilo dele...

- Então pode ser aquela mulher - concluiu Nicole.

- A Samantha? Duvido... Eu apostaria nos outros dois.

- No David ou no que não abre a boca?

- É Davis - corrigiu Adam com um leve riso. - E acho que poderia ser qualquer um deles.

- Creio que o que fica calado é mais suspeito. Talvez não diga nada para não se incriminar em um deslize.

- Enfim, o fato é que temos três susp...

- Quatro! Não podemos excluir o Jacques por que confia nele. Nenhum deles parece ser assassino.

- Que seja - sussurrou Adam. - Temos que tomar cuidado com todos eles e sermos muito cautelosos!

- Tem razão, bastante cautelosos... - realçou baixinho, sonolenta.

E os dois se puseram a dormir.

* * *

Kaninchen estava do lado de fora da confeitaria. Não podia sair do campo de vista dos outros, pois levantaria suspeitas. Sentou-se na calçada há alguns minutos e ficara ali refletindo. Ao mesmo tempo em que precisava permanecer na confeitaria, precisava conversar com Wert. Tinha que impedir que os dois intrusos revelassem o conteúdo do diário, só que não conseguia pensar em nada! Estava prestes a se levantar, quando uma voz chamou seu nome.

Kaninchen olhou e viu Wert de pé, perto à parede.

- O que está fazendo aqui?! - assustou-se. - Se alguém te ver...

- Ei, calma! - disse Wert - Ninguém que está lá dentro pode me ver! Ora, você também estava com vontade de falar comigo.

Kaninchen não pôde negar.

- Realmente... mas você não pode aparecer a essa hora perto da confeitaria!

- Relaxa! É só você parar de olhar pra mim e ninguém vai desconfiar que estou aqui.

- Tudo bem, então - concordou, voltando a encarar a paisagem à sua frente.

- E o que eles sabem sobre nós e o diário?

- TUDO!

- Kani, acalme-se e volte a olhar para frente! - advertiu. - O que os dois já contaram?

- Bom, eles estavam falando da história deles. De como eles chegaram aqui e tal... Não revelaram tanta coisa.

- E sobre o diário? - indagou Wert.

- Não disseram nada ainda. Só que foi seu irmão quem o escreveu. Foram dormir e, quando acordarem, os desgraçados pretendem revelar tudo!

- Malditos! Não pode impedi-los?

- E como eu vou fazer isso? Todos estão juntos agora! Todos estão sendo vigiados, estou me sentindo como em uma prisão! Agora vá! Assim que puder, te procurarei para conversarmos.

- Tudo bem, eu vou. Mas antes...

Como não ouviu mais nenhuma palavra, Kaninchen olhou para ver o que estaria fazendo e viu Wert colocar no chão um pequeno embrulho do tamanho de um tijolo.

- O que é isso? - perguntou Kan.

- Você sabe o que é.

- E para quê?

- Ora, é óbvio.

- Você quer que eu exploda a confeitaria? - espantou-se.

- Talvez, se os dois intrusos do outro grupo estiverem dentro dela, poderia ser útil....

- Ei, você enlouqueceu? Isso aqui é a nossa fonte de mantimentos, eu não posso jogar tudo pelos ares!

- Você é quem sabe.

Kaninchen inquietou-se com seus pensamentos enquanto Wert se afastava, sem olhar para trás. A bomba estava ali, ao lado da confeitaria.

Quando, pela segunda vez naquele dia ouviu chamarem seu nome, fez um gesto para a pessoa e se levantou, entrando na confeitaria.

Não sem antes dar, de relance, uma olhada no embrulho e imaginar se não seria aquela a única solução...

(Continua...)

FELIZ NATAL A TODOS!


Próximo capítulo: Quarta-feira, 26 de dezembro

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