Ainda era de manhã e o Sol estava nascendo quando Jacques Chevalier levantou de sua cama. Havia dormido por quatro horas, mas sabia que era o máximo que conseguiria; sofria de insônia desde os 17 anos.
Como era de costume, foi à biblioteca, retirou um livro de capa vermelha da estante e começou a ler. Aquele livro, dizia, recordava-o de sua infância em Chaumont, quando corria em volta da praça enquanto sua mãe o observava, serena. Mais tarde passou a se dedicar aos estudos, e já com 26 anos ficou bastante conhecido no mundo científico por ter revolucionado o conceito de Mecânica Quântica e Física Nuclear e criado uma seqüência lógica de números - chamada seqüência elíptica - que tinha uma relação com as Leis de Kepler.
O livro que Jacques lia havia sido publicado na França por uma editora de um amigo de seu pai e, por isso, lhe trazia muitas recordações. Mais do que isso, a vendedora que lhe havia vendido o tal livro, veio a ser, alguns anos depois, a mulher de Jacques.
E as lembranças começaram a surgir em sua mente...
***
- Com licença, posso ajudar o senhor? - perguntou a gentil atendente.
- Err... Eu estou procurando um livro, mas acho que...
- Qual o nome, senhor?
- Jacques.
A moça deu uma risada breve e falou:
- Não, não, o nome do livro, senhor. Qual é?
- O Triângulo de Pas... pas...
- O Triângulo de Paz, senhor?
Jacques não estava conseguindo se concentrar mais, outra coisa lhe chamava a atenção.
Ele não havia percebido a beleza da moça até aquele momento, mas quando o fez de súbito, pensou não haver mulher mais linda que ela. Seus longos cabelos castanhos caiam divinamente sobre seus ombros e seu rosto claro e afável contrastava com seu olhar severo que talvez ostentasse para não se mostrar submissa. Também ágeis eram seus olhos e, por isso, logo percebeu o que distraia Chevalier.
- Senhor, por gentileza, pode voltar a atenção ao assunto relacionado ao livro que o senhor deseja?
- Ah claro, perdão... Ele se chama O Triângulo de Pascal...
- Eu vou pesquisar em nosso acervo, enquanto isso o senhor...
- Me chame de você, por favor.
- Como você quiser - riu ela - bem, há cadeiras lá naquele canto, e o senh... digo, você, pode se sentar e esperar.
- Por você eu espero até a eternidade.
- Bem, veremos... - replicou a moça, um pouco constrangida.
Ela, então, esboçou um pequeno sorriso e se retirou.
Christine - como a atendente se chamava - voltou pouco depois com o livro de capa vermelha na mão. Jacques estava lendo um panfleto anunciando uma promoção da loja, e quando viu ela se aproximar, perguntou:
- Me parece que a cada livro de auto-ajuda que eu comprar, dez por cento da venda irá para você, certo?
- Correto.
- Ok, então. Além do livro que pedi, me vê um exemplar de cada livro de auto-ajuda que houver nesta loja!
- O senhor gosta? - perguntou a moça.
- Não. - respondeu sorrindo.
Um tanto quanto tímida, mas contente com a atitude do homem, disse:
- Eu ganho sete por cento na venda de cada livro sobre pescaria. Interessado?
***
Acordando de seus devaneios, Jacques guardou o livro de volta na prateleira e suspirou. Astrônomo amador, ele resolveu ir para o terraço de sua casa observar o começo do fenômeno que estava para acontecer em alguns minutos.
- O dia
Para Jacques a noite já estava animadora em demasia e nada o preparou para a surpresa que teve quando chegou ao terraço. Deixou sua luneta cair no chão - o que teve como conseqüência uma lente quebrada - e ficou olhando boquiaberto para o fenômeno que dançava no céu naquele instante.
O físico francês depois de ficar minutos incapaz de se mover, devido à beleza do que havia acabado de presenciar, desceu correndo as escadas e pegou o telefone para avisar alguém. Todavia, a decepção correu por seus olhos quando percebeu que o telefone estava mudo.
Meia hora depois, Jacques Chevalier corria desesperadamente pela rua rumo a um lugar onde morava alguém que ele tinha certeza que o ajudaria a encontrar uma explicação para tudo aquilo.