domingo, 25 de novembro de 2007

Capítulo 29 - O Furto

Na tarde do dia em que Lin havia sido morta, as nove pessoas notaram seu sumiço logo que estavam retornando da praça.

- Onde está a Lin? Algum de vocês a viu? - questionou alguém.

Todos balançaram a cabeça negativamente. Um deles porém estava mentindo: Kaninchen. Fora Kaninchen quem havia posto a chinesa sob a mira de sua arma e entregue-a a Wert há poucos minutos. Para sua sorte, porém, ninguém havia notado nem ouvido nada.

Enquanto isso, os outros indagavam para si como Lin havia desaparecido sem nenhuma pessoa perceber e tentavam não demonstrar seu medo. Era claro agora que mesmo em plena luz do dia, Kaninchen estava pondo seu plano de assassinato em prática.

Apreensivos, resolveram então ficar reunidos para evitar um outro ataque. Sabendo que era inútil tentar salvar Lin, já que nem mesmo sabiam onde ela estava, decidiram-se por ficar à porta da confeitaria, os nove.

De imediato, o esquema pareceu uma boa idéia - que poderia não dar certo somente se, por exemplo, Kaninchen resolvesse sacar um revólver e atirar em todos -, no entanto conforme as horas iam passando eles pareceram preferir pôr sua vida em risco a ficar todos juntos.

Como de costume, Jacqueline e Gary permaneciam calados; Anthony e Susan conversavam entre si, tal qual Davis e Samantha; Edwin, por vezes, se virava para falar com Joanne e Jacques, na maioria do tempo, estava absorto em seus pensamentos.

De dezessete pessoas, somente nove haviam restado. E, se dependesse de Kaninchen, esse número só tendia a diminuir...

Já que o plano de ficarem agrupados não teve muito sucesso, a única condição que impuseram para se espalhar pela confeitaria foi de cada um observar constantemente os gestos da pessoa que estivesse em seu campo de visão e, caso alguma atitude parecesse suspeita, deveria, então, gritar para os outros.

O fato de Kaninchen estar entre eles, ouvindo todo o esquema, era, no mínimo, irônico. Se Kan sabia qual era o plano, obviamente, se desejasse matar alguém, não o faria conforme todos esperavam. Mesmo assim, era o único meio de eles tentarem deter a pessoa assassina.

Algumas horas depois de o Sol se pôr e as estrelas começarem a aparecer, ninguém se deu ao trabalho de idealizar um esquema para impedir outro assassinato. O único ato que fizeram foi dormir próximos um do outro. De qualquer forma, isso não impediu que Kaninchen saísse da confeitaria sem ser notado e se dirigisse a casa em que Wert e sua refém se encontravam.

Horas depois, Lin estava morta, estirada na rua de paralelepípedo.

* * *

No dia seguinte, ninguém se deu ao trabalho de procurar Lin. Nem imaginavam que ela estava a somente algumas quadras dali.

O que os levou até ela foi o leve tom avermelhado da água que havia rente ao meio-fio, descoberto por Joanne. Como havia chovido durante a madrugada, o sangue que escorria do corpo da chinesa havia se misturado à água que caia dos céus e fluía próxima à calçada.

Assim que dobraram a esquina e andaram alguns metros, viram a moça estirada no meio da rua e trataram logo de enterrá-la. Ao ir à praça, todos ficaram bem atentos nos que estavam ao seu redor para garantir que ninguém mais fosse capturado, pelo menos durante a manhã.

Quando se puseram a observar o tabuleiro de xadrez, um por um ficava boquiaberto conforme contava a quantidade de peças brancas.

Jacqueline até olhava freqüentemente para o local em que haviam enterrado Lin, como se esperasse que ela se levantasse a qualquer momento e dissesse que não estava morta afinal. Todavia, isso nunca aconteceria.

Mesmo um do grupo deles havendo sido morta, continuava havendo nove peças brancas em jogo. Por quê?, era o que eles se perguntavam.

Com relação às peças pretas, porém, mais uma torre havia desaparecido.

Foi Edwin quem se manifestou primeiro:

- Quem foi o primeiro a ver Lin?

- Acho que eu. - respondeu Susan. - Quando eu a avistei pela primeira vez ela estava sozinha e parecia um pouco abatida por sinal.

- Bom - argumentou Davis -, todos estávamos, não é?

- É, tem razão, mas do jeito que ela ofegava parecia que havia corrido bastante para chegar até a praça! - lembrou a jornalista.

Samantha que havia se mantido calada até então, perguntou:

- E se ela não chegou aqui no mesmo dia que nós?

As palavras que haviam acabado de ouvir remoíam agora na cabeça dos nove sobreviventes. O grande problema era que a única pessoa que eles presumiam que poderia esclarecer todas essas dúvidas, havia acabado de ser enterrada.

* * *

A distração do problema não elucidado de Lin havia dado uma grande vantagem a Kaninchen. Graças a todos estarem completamente absortos nos mistérios cada vez maiores daquela cidade, Kan pôde deixar a confeitaria mais cedo naquele dia. Sabia, contudo, que não poderia se demorar ou senão dariam sua falta.

Assim que saiu pelas portas de vidro do estabelecimento, Kaninchen desatou a correr em direção a casa onde planejava e executava seus homicídios. Ao chegar lá, entrou sem bater na porta e se surpreendeu em ver Wert de cabeça baixa apoiada nos braços e sentada na cadeira em que muitos já haviam derramado seu sangue.

- Kani, ainda bem que você chegou! - disse. E quando levantou a cabeça, Kaninchen pode ver que seu rosto estava avermelhado de cólera. - Aconteceu algo horrível!

Já sentindo apreensão por imaginar a perspectiva de mais alguém poder atrapalhar seus planos, Kaninchen não se demorou a perguntar qual era o problema.

- O diário, Kani... o diário... - foi só o que Wert murmurou, lacrimejando de nervosismo e raiva.

- Pare de chorar e diga de uma vez! O que houve com o diário?

- Ele... ele...

- FALE!

- Ele desapareceu!

Naquele momento, a pouca luz que iluminava o cômodo pareceu se apagar para Kaninchen, mergulhando todos seus pensamentos em um apavorante breu. Se fosse verdade, provavelmente a única solução que haveria seria abandonar todo seu estratagema e matar a todos de uma vez. Tentando inutilmente manter a calma, perguntou:

- Como? O que aconteceu afinal?

- O diário, ele... ele estava dentro do baú que há subindo as escadas, você sabe... a última vez que eu conferi se ele estava lá foi ontem, antes de sair à tarde para trazer Lin para cá...

- E? - apressou Kaninchen.

- E hoje quando eu fui procurar o diário, ele não estava mais no baú! Alguém o pegou, Kani, alguém o pegou!

- MALDIÇÃO! Como você deixou isso acontecer?! Foi o grupo das peças pretas, não foi? Óbvio que foi! É, claro, bastou eles esperarem você sair e depois pegarem o diário!

Pensando um pouco, Kaninchen acrescentou:

- Bem, pelo menos eles não têm a chave! Nunca conseguirão abrir o diário sem a chave...

- O problema é que a chave... ela...

- A CHAVE O QUÊ? - berrou Kan, já não conseguindo se conter.

- Não foi minha culpa! - gritou Wert - Eu não sei como aconteceu, juro! Eu coloquei-a na gaveta ontem e hoje quando a procurei não estava...

Wert parou subitamente de falar quando Kaninchen esmurrou uma pequena mesa que havia à sua frente.

- IDIOTA! VOCÊ SABE O QUE VAI ACONTECER SE ELES PUDEREM LER O CONTEÚDO DO DIÁRIO!

- Tente pensar pelo lado positivo - disse Wert cautelosamente - Os escritos do diário estão em latim, eles não conseguirão lê-lo!

- Imbecil - rebateu Kaninchen -, no grupo deles , sim, uma pessoa que conhece a língua!

- É, eu sei, mas a chinesa disse que o homem que sabia ler latim fugiu no mesmo dia em que ela trocou de grupo e ela acreditava que eles não se dariam ao trabalho de procurá-lo!

- ELA MENTIU PRA VOCÊ! Tenho certeza que agora eles vão revirar a cidade inteira em busca desse infeliz!

- Pode até ser, mas eles não poderão achá-lo vivo se você o matar primeiro!

Kaninchen riu, debochado.

- Você acha mesmo que eu vou olhar casa por casa à procura dele?! Além do mais, o grupo em que estou já está começando a ficar mais astuto e precavido. Não, acho que o melhor a fazer é resgatar o diário e a chave.

- E você tem um plano?

Antes de responder, Kan olhou para Wert e deu um leve sorriso.

- Eu sempre tenho um plano.

E saiu.

(Continua...)


Próximo capítulo: Quarta-feira, 28 de novembro

Um comentário:

Luiz Fernando Teodosio disse...

Cara, não acha que essses personagens estão lerdos demais a ponto de não perceberem que toda noite alguém sai de fininho?